Sérgio Paulo Muniz Costa (*)
Direitos Humanos são a maior conquista dos povos ao longo da História. Tornados universais após o horror do Holocausto na Segunda Guerra Mundial, eles transpuseram quase todas as barreiras que separavam a humanidade na busca de um futuro de paz. O Brasil teve papel relevante nessa arquitetura erguida há mais de sessenta anos, como vitorioso na guerra e ator prestigiado daqueles primeiros momentos da Organização das Nações Unidas, existindo muito boas razões para o país proferir anualmente o discurso de abertura da Assembléia Geral.
É uma lástima que o governo brasileiro, ao voltar a abrir a assembléia Geral da ONU, esteja comprometido no projeto de criação de uma comissão para apurar violações dos Direitos Humanos patrocinada pela sigla e ideais do comunismo. A sociedade brasileira, politicamente anestesiada, até pode se acomodar no desconhecimento, mas não é possível esconder do mundo a ausência da URSS, Ucrânia, Bielorrússia, Tchecoslováquia, Polônia e Iugoslávia, todos sob regime comunista, na causa dos Direitos Humanos, quando se abstiveram, juntamente com a África de Sul e Arábia Saudita, de votar na ONU a histórica declaração no dia 10 de dezembro de 1948. Stalin, o supremo ditador totalitário remanescente, não estava interessado em concessões a direitos e liberdades individuais no império comunista consolidado à base de expurgos, assassinatos e deportações. Ademais, a retribuição russa à barbárie nazista durante a guerra fez do Exército Vermelho o instrumento de terror ideal para o domínio soviético da Europa Oriental que durou até o final do século XX.
No Brasil de hoje, se o caminho parece aberto para um governo que suprime o debate, aproveitando-se da degradação da politica e recorrendo à propaganda enganosa para impor um projeto sem qualquer preocupação com equilíbrio, transparência e reconciliação nacional, do ponto de vista internacional é impossível que essa incoerência deixe de trazer descrédito ao país. Inevitavelmente, as Forças Armadas serão atingidas pelos trabalhos da comissão, porém, a grande prejudicada será a politica nacional, na medida em aqueles que apelaram à violência em prol da implantação de um sistema totalitário no País vierem a ser ungidos como heróis, resultado previsível do que está em curso e já se delineia na desenvoltura com que personagens controversos se movem ao arrepio da lei e da ética. Jamais uma causa tão nobre teve propósitos e agentes tão espúrios. Jamais um governo brasileiro foi tão longe para impor uma versão única do passado do País. A comissão nunca pretendeu tratar do passado. Ela visa, a partir de uma vingança, um futuro exclusivo e excludente. O Brasil se inclina perigosamente para o lado errado da História.
No que diz respeito às Forças Armadas, não pode ser esquecido que “a reflexão sobre a realidade brasileira está, por assim dizer, embutida nos próprios alicerces da condição e da experiência dos nossos militares. De todos os grupos sociais do País, são eles, e em especial os do Exército, que têm a autêntica visão de conjunto dessa realidade. E esse é um aspecto precioso, que a modesta vida do oficial, nas guarnições espalhadas por sobre a nossa imensa geografia, metaboliza em reflexão”. Os militares brasileiros têm historicamente o dever e o direito de pensar o País, sem o que não poderão defendê-lo. A Nação tem que ouvi-los e nesse sentido as modificações no projeto da comissão apresentadas pelos comandantes militares devem ser tomadas em conta e não puramente desconsideradas em nome de interesses políticos que não alcançam a grandeza e o significado da disciplina e da subordinação militar às autoridades legalmente constituídas. Somente os conteúdos originais do Estatuto dos Militares e dos Regulamentos Disciplinares já teriam muito a ensinar a políticos, juristas e militantes, partícipes ou não da nefasta comissão.
Com as armas legítimas do estado e o sangue generoso do seu povo o Brasil defendeu a democracia e os direitos humanos, como é até hoje reconhecido nos monumentos da região da Emilia-Romanha na Itália onde os pracinhas combateram entre setembro de 1944 e maio de 1945. No Monumento Votivo Militar Brasileiro em Pistóia se lê:
“Esta terra sagrada foi sepultura dos soldados brasileiros mortos no campo da honra pela dignidade da pessoa humana. MCMXLV”
À luz da História, a comissão pretendida pelo governo ultrapassou a questão da verdade ou da mentira.
Trata-se de uma infâmia.
(*) Sérgio Paulo Muniz Costa é historiador. Foi delegado do Brasil na Junta Interamericana de Defesa, órgão de assessoria da OEA (Organização dos Estados Americanos) para assuntos de segurança hemisférica.
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