terça-feira, 22 de novembro de 2011

A REVOGAÇÃO

O estrépito de uma grande massa de metal se deslocando tirou da sua habitual modorra os militares que estavam de guarda em torno do Palácio da Alvorada duas horas antes do nascer do sol. Olhando para fora perceberam uma enorme estátua eqüestre de um oficial do século XIX.

“Chamem o oficial da guarda”, tonitroou a estátua.

Os soldados correram chamar o oficial do dia. Este se aproximou e olhou para cima incrédulo.

“Quem é o gozador que trouxe a estátua do Generalíssimo Deodoro da Fonseca para cá”, perguntou.

A estátua falou rispidamente: “Respeite-me! Você me deve continências capitão. Ou acaso aboliram toda a disciplina no Brasil?“

Sem acreditar no que fazia o capitão perfilou-se e prestou continência à estatua, no que foi seguido pelos seus soldados.

“General..mmm Marechal, digo Presidente, o que o senhor está fazendo aqui?”

“Pode ter certeza que não estou aqui fugindo dos pombos do Rio de Janeiro; sabe que dia é hoje?”

“Sim senhor, dia 15 de novembro. Dia da República.”

“Exatamente, e vim aqui corrigir alguns erros cometidos. Em 1989 saí de casa a pé doente e combalido para apaziguar ânimos e para deter alguns políticos corruptos. De repente vi-me posto em cima de um cavalo a despeito de minhas dores. De repente todos estavam saudando a proclamação da república.

Os políticos corruptos continuaram de uma forma ou outra próximos ao poder. A república que devia ser federalista virou um império centralizado sem monarca. E a corrupção ficou pior do que ao tempo do Imperador.

Agora convoque os governantes e militares desta cidade sem Deus e sem Moralidade que tenho algumas palavras a dirigir-lhes.”

“Presidente, digo General, o senhor escolheu um mau ano para isto. Ontem foi segunda-feira, todos os altos escalões dos três poderes fizeram fim-de-semana comprido e estão no litoral ou na serra em seus estados de origem. Os únicos que estão aqui são os jornalistas para verem se escapa mais um escândalo nos ministérios.”

“Vergonhoso! Mas então chamem a imprensa.”

Neste meio tempo uns 30 jornalistas curiosos já se acotovelavam para ver o que e quem era aquele magnífico cavaleiro de bronze fundido que falava. Ouvia-se um burburinho: “Quem é a estátua?”, ou “O que? O primeiro presidente do Brasil?”. “Proclamou a Independência”? “Não. A República.”

Então Deodoro falou: “Senhores da imprensa. Do alto deste cavalo tenho observado o Brasil ao longo de um século. Tenho observado enormes progressos científicos, tenho visto o país se desenvolver economicamente, mas tenho observado o desenvolvimento de uma sociedade corrupta e sem alma. Uma sociedade de políticos sem lealdade ao país e sem lealdade ao povo. Uma sociedade que tanto decaiu que hoje as pessoas que lesam seus semelhantes ou aos que os elegeram nem se preocupam mais em não ser descobertas em erros, mentiras, chicanas ou roubos, pois não existe mais opróbrio em ser pego em flagrante.

Portanto, suposto proclamador da República que sou vim a esta cidade-sede do governo brasileiro proclamar o seguinte. Fica desproclamada a República, fica desfeito também o Grito do Ipiranga. Voltemos ao Reino Unido de Portugal e Algarve e tentemos a partir

daí criar uma sociedade melhor. E ao mesmo tempo vamos socorrer nossos irmãos de Portugal unindo-os à nossa pujante economia.

E por favor, quando meu conterrâneo Fernando Collor desembarcar no aeroporto, prendam-no numa masmorra e joguem a chave fora. Os ouros membros do executivo e legislativo podem ser mandados a uma fazenda de reeducação na Antártida Brasileira.”

E virou o cavalo e saiu galopando rumo ao sol nascente.


Ralph J. Hofmann

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