quinta-feira, 24 de maio de 2012

Islamista no poder não significa Estado extremista no Egito

Uma eventual vitória de um candidato islamista na eleição presidencial no Egito não tornaria necessariamente o país um Estado extremista, segundo analistas ouvidos pelo Terra. Para eles, um presidente islâmico teria que adotar políticas moderadas se o Egito quiser ter abertura junto à comunidade internacional, atrair investidores estrangeiros e ter um papel político ativo na região.

Para o cientista político Mostafa Elwi Saif, da Universidade do Cairo, os islamistas sabem que para governar terão que suavizar os discursos para acalmar a parcela da popualção egípcia que teme o poder dos movimentos islâmicos. "Salafistas e Irmandade Muçulmana sabem que o Egito é secular por tradição e uma guinada ao radicalismo levaria a um caos interno", disse o analista.

Saif também explicou que militares egípcios também não querem ver o país sob uma bandeira extremista, uma vez que as Forças Armadas têm fortes ligações com a elite dominante, esta secular, e que apoiava o regime de Mubarak. "Os militares e islamistas vinham tendo desavenças nos últimos meses. Irmandade Muçulmana e a junta militar chegaram a trocar críticas em público. Mas islamistas sabem que as Forças Armadas não querem perder sua posição forte no país, então um cofronto com os militares não deve estar em seus planos", disse.

Cinquenta milhões de eleitores votam em 12 candidatos neste segundo dia da eleição histórica no Egito, a primeira desde a saída de Hosni Mubarak do poder após o levante da Primavera Árabe em fevereiro do ano passado. Dois candidatos islamistas, Mohamed Mursi, da irmandade Muçulmana, e Abdel Moneim Aboul Fotouh, islamista moderado que concorre como independente, estão entre os favoritos para chegar em um eventual segundo turno.

Além deles, Amr Moussa, ex-ministro de Relações Exteriores e ex-chefe da Liga Árabe, e Ahmed Shafiq, último primeiro-ministro no governo de Mubarak, também aparecem como favoritos e representariam os "remanescentes" do antigo regime.

Cristãos e seculares
O crescimento dos islamistas vem causando preocupação entre seculares e minorias religiosas, como os cristãos coptas, que totalizam cerca de 10% da população egípcia de mais de 80 milhões. Eles temem que um presidente islamista, com o apoio do Parlamento, onde a Irmandade e salafistas controlam mais da metade das cadeiras, poderiam instituir um Estado islâmico, com base na sharia (lei islâmica).

Embora líderes da Irmandade Muçulmana já tenham, em várias oportunidades, assegurado que não pensam em mudar o caráter secular do país, alguns analistas e na imprensa e mídia egípcia temem que a prática poderá ser diferente dos discursos dos islamistas e o Egito poderia tornar-se em uma espécie de Irã, onde prevalece uma teocracia islâmica.

"Essa é uma realidade que tira o sono de muitas pessoas, especialmente cristãos, mas também desafia os muçulmanos seculares e moderados", falou o analista Ahmed al-Korany, do Centro Al Ahram para Estudos Políticos e Estratégicos no Cairo. De acordo com ele, o Egito vive, hoje, uma fase muito importante já que a revolução ainda está em curso. "A revolução do ano passaod ainda não acabou, pois o país ainda vive fases de transformações e definições sobre o tipo de deocracia que vai servir melhor aos egípcios. No momento, há duas: a democracia secular e a aquela islâmica".

Mas ele alerta que as duas - secular ou islâmica - podem virar regimes opressivos. "Ter um governo secular não é garantia de que será livre de extremismo. Se islamistas forem moderados, podem governar de forma positiva".

Empresários e grupos poderosos no país, que investiram muito na época de Mubarak e temem a fuga de investidores estrangeiros, também temem um governo liderado por um islamista. Segundo Korany, o Egito recebia mais de US$ 6 bilhões em investimentos estrangeiros em 2010, mas hoje giram em torno de apenas US$ 500 milhões.

"A instabilidade política dos últimos 15 meses contribuiu para uma fuga de investidores. Mas, além disso, a vitória expressiva de islamistas nas eleições parlamentares no ano passado impede a entrada de investimentos porque há o medo sobre o futuro do Egito".

Sem medo de islamistas
Outros analistas, como o cientista político Fahmy Howeidy, garantem que medos da população são exagerados. "A maioria dos egípcios quer uma democracia com valores religiosos, não uma teocracia", enfatizou Howeidy.

Segundo uma pesquisa feita pelo Gallup de Abu Dhabi, apesar de cerca de 96% dos egípcios acreditarem que a religião seja importante e 92% da população confiar nas instituições religiosas, a maioria dos egípcios ainda acredita que os líderes religiosos não deveriam ter autoridade para determinar as leis do país, limitando-se a um papel de conselheiros.

"Não acho que a Irmandade, salafistas ou islamistas em geral constituem um perigo para o Egito", opinou Howeidy, que acusa os partidos liberais e seculares de usarem a "islamofobia" para amedrontar as pessoas e conseguir sua parcela de votos.

O medo de um golpe islamista não é novo no Egito. Durante o regime de Hosni Mubarak, o governo sempre mostrou os islamistas como um perigo estratégico ao país. A popularidade da irmandade Muçulmana junto às massas era, segundo as autoridades, uma amostra de que os islamistas tomariam o poder caso o Egito se tornasse uma democracia. "Isso era usado apra justificar a repressão à Irmandade e outros oposicionistas, plantando o medo nas pessoas. Hoje, esse medo parece que continua", disse ele.

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