Ralph J. Hofmann
Meu primeiro emprego de tempo inteiro foi numa cutelaria. Na década de sessenta estávamos entre os primeiros exportadores de manufaturados do Brasil.
A empresa fora feita por imigrantes alemães que pertenciam a partidos políticos que o nazismo começara a perseguir. Viram cedo o que iria acontecer e trouxeram ao Brasil sua habilidade de mestres de diferentes áreas da cutelaria. Construíram aqui uma empresa que produzia facas, tesouras e talheres de qualidade alemã.
No fim dos anos sessenta esta empresa exportava produtos que se equiparavam com os melhores do mundo. Com operários brasileiros. Para se ter uma idéia 2,5% da cutelaria consumida pelos Estados Unidos vinham desta empresa. E era justamente no segmento de qualidade, mais caro do mercado. Os produtos descartáveis vinham do Japão.
Isto era feito com “know-how” imigrado e mão de obra brasileira. Com o tempo vieram a produzir também produtos de consumo de massa, de baixo custo, pois havia outras empresas brasileiras fazendo isso.
Esta semana precisei de alguns talheres e facas. Achei as velhas marcas. Só que visivelmente eram feitas na China.
Quando se trabalha em um ramo, particularmente em comércio exterior, nunca se esquece o que aprendeu. Sempre se examina os produtos criticamente. Posso lhes dizer que paguei pouco pelo que comprei. E que dentro de um ano terei de fazer nova compra. As facas vem com excelente fio, mas se perderem o fio não será fácil afiá-las. A alma da faca onde se prende o cabo é curta. O cabo pode quebrar com um efeito de alavanca, e assim sucessivamente.
Se o Brasil não tivesse esta voracidade por impostos em cascata sobre a produção e mesmo sobre máquinas operatrizes, se o industrialista brasileiro pudesse comprar o aço ao preço dos concorrentes na China e em outros paises creio que ainda haveria um grande mercado para os produtos locais. Mesmo com os operários chineses trabalhando por uma pequena percentagem do salário mínimo brasileiro.
Houve momentos da minha carreira em que para fugir ao ágio de ferroligas, ou ao preço exagerado de tubos de aço eu importei matéria prima. Comprando esta ao preço internacional viabilizávamos negócios, apesar de precisarmos conviver com a má vontade de obscuros funcionários dos nossos sistemas de controle que se preocupavam mais em não deixar importar do que em aumentar as exportações.
Quando o atual governo fala em estancar a entrada de produtos pela sobre-taxação isto me preocupa. Não é por aí. O país precisa viabilizar aumentos de exportação de manufaturados brasileiros. Estender um guarda chuva leva à obsolescência como aconteceu no anos 70 e 80. Precisamos ser pró-ativos e agressivos.
Mas não adianta querer isto enquanto tivermos um governo que não está disposto a cortar fundo na carne podre da administração pública de projetos estruturais destinados a alimentar seus “dependentes”.
O governo procura adquirir centenas de vagas para brasileiros em instituições como a MIT (Massachussetts Institute of Technology). Mas os melhores não voltarão, pois serão recrutados lá. A idéia seria boa se estivessem interessados em fortalecer os cursos técnicos e os centros de excelência das ciências exatas e engenharia no Brasil, afora eliminar o mal causado por quotas que podem significar que os cursos deverão reduzir sua demanda de conhecimentos sobre os alunos ante a total falta de estudo em
profundidade dos que saem do ensino médio ungidos por uma quota. Há qualquer quantidade de brasileiros para preencher os cursos superiores de abordagem técnica. São oriundos de todas as camadas e cores da população. Aqueles com garra não precisam de favor para entrar na faculdade. Alguns precisam, isto sim, de bolsas que lhes permitam freqüentar a faculdade quando tenham passado no vestibular. Sei disto pois convivi com brilhantes estudantes sem recursos há 40 ou mais anos atrás. Com sacrifício se graduaram e contribuíram para com o país. E eram dos mais práticos. Haviam ocupado diversos empregos no caminho da graduação. Sabiam na prática como funciona um chão-de-fábrica ou um escritório de projetos. Depois da graduação tinham esta vantagem. A teoria e a prática. E a capacidade forjada em condições adversas de resolver problemas.
Antigamente o Sr. Delfim Neto compensava o custo Brasil e a cascata de impostos pela concessão de crédito-prêmio. Hoje fazer isto seria gatilho para uma infinidade de acusações de “dumping”, ou seja, venda abaixo de preço justo causando dano ao importador. Aliás, já no tempo de Delfim Neto as empresas exportadoras mais bem –sucedidas acabavam gastando anualmente fortunas em advogados para se defenderem contra processos de venda abaixo de preço justo.
O pior é que não vejo ninguém em Brasília, em nenhum ministério, que tenha o menor preparo para ouvir as pessoas que poderiam saber o que exigir em termos de viabilização da nossa indústria. Passam seu tempo agitando seus mestrados e doutorados de araque mas não entendem nada.
Os, notáveis, ou seja, os empresários, liderados pelo Dr. Jorge Gerdau Johanpeter certamente saberiam o que dizer, mas certamente sabem que não adianta dizê-lo. Portanto fazem presença, na esperança de evitar desastres maiores.
Política industrial fica para um dia. Se ainda houver oportunidade. Hoje somos paiol de alimentos e província mineral do mundo.
Lá se vão décadas de esforço para sermos uma nação industrial.
E estamos criando uma geração de copeiros, cozinheiros, e funcionários do comércio.
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