O governo culpa a crise nos países ricos pela queda do PIB. Mas essa é só uma parte do problema: há também fatores domésticos, como a dependência das exportações de matérias-primas e a baixa competitividade da indústria.
Durante algum tempo, tudo correu bem. A economia brasileira vinha crescendo em média 4,5% ao ano entre 2004 e 2010, apesar da recessão de 2009. Em 2010, chegou a avançar 7,5%. Mas desde o ano passado, a situação começou a azedar. No início da semana, o governo reduziu a perspectiva de crescimento em 2012 para apenas 3% – observadores consideram a metade disso mais realista.
A presidente Dilma Rousseff continua a apontar a crise europeia e o baixo crescimento da economia mundial como causas para as perspectivas mais pessimistas. Mas uma análise mais profunda do problema mostra que essa explicação não basta.
Se o ranking da revista chilena Economía América estiver correto, apenas uma das dez maiores empresas brasileiras não está ligada ao setor de commodities: o grupo Pão de Açúcar, em oitavo lugar. A número um é a paraestatal Petrobras, seguida por empresas dos setores de mineração, metalurgia e agricultura, além do conglomerado Odebrecht, que opera em vários setores de commodities.
Nada surpreendente, já que a economia brasileira sofre justamente porque não tem muito a oferecer além de matérias-primas. De acordo com o Ministério da Economia, a parcela de participação das commodities nas exportações brasileiras saltou de 26,3% para 44,6% na primeira década do século.
Embora o comércio exterior tenha quadruplicado no período, a indústria não conseguiu acompanhar o ritmo, diz o professor Federico Foders, do Instituto de Economia Mundial de Kiel, na Alemanha. "Os produtos industrializados do Brasil perderam em competitividade." O economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (Iedi), Rogério de Souza, vai além e afirma: "A indústria brasileira claramente não é competitiva."
Ciclo de baixo crescimento
Economistas atribuem parte do problema a fatores externos. "A valorização do real frente ao dólar, e especialmente frente ao yuan, tornaram as tão criticadas tarifas de importação brasileiras praticamente supérfluas", diz o diretor da fundação alemã Friedrich Ebert em São Paulo, Yesko Quiroga. A valorização do real acaba prejudicando a indústria duplamente: ela dificulta as exportações dos produtos brasileiros e, ao mesmo tempo, acirra a concorrência no mercado interno com os produtos importados.
"Parte da desaceleração se deve ao ciclo econômico", diz o economista-chefe do Banco Itaú, Ilan Goldfajn. Ele lembra que o país tem um histórico de luta contra a inflação, que no passado já chegou a marcas mensais de dois dígitos. A luta contra a inflação está na origem da política de juros altos do governo brasileiro. O último pico da Selic, a taxa básica de juros do Banco Central, foi alcançado há exatamente um ano, com a marca de 12,5%. No momento, a Selic é de 8%.
A alta taxa de juros, por sua vez, é uma das explicações para o valorização do real. "Como a taxa de juros nos países desenvolvidos é muito baixa, uma grande quantidade de capital fluiu para o Brasil, o que pressiona a alta do real", comenta Foders.
Não necessariamente cíclico é o fato de que o maior mercado consumidor para o minério brasileiro, a China, esteja quase saturado. "A China está superando a fase de desenvolvimento, na qual muita matéria-prima é necessária para a produção de máquinas", diz o economista. "Agora as fábricas chinesas já estão de pé."
Política econômica confortável
Mas atribuir a desaceleração da economia brasileira apenas ao mercado mundial é equivocado. Durante anos o governo protegeu o mercado interno com tarifas de importação, de forma que as empresas não sofriam pressão para inovar.
Além disso, o país oferece altos custos trabalhistas, de financiamento e burocracia. Quando a concorrência era apenas interna, isso não importava, já que todos estavam nas mesmas condições. Mas na hora de competir com a China, o Brasil fica para trás. "É caro produzir no Brasil: infraestrutura, carga tributária, burocracia. Os custos são muito altos", diz Souza, do Iedi.
Em vez de reduzir os custos institucionais, o governo tenta reverter o baixo crescimento da economia com as recentes reduções de juros e programas de incentivo ao investimento. Mas esses custam dinheiro, que o Estado, na verdade, não tem. A dívida pública brasileira gira em torno dos 50% – percentual alto para um país emergente. "E o Brasil tem ainda a maior carga tributária da América Latina", diz Foders.
A carga tributária brasileira é de cerca de 40%. Isso é menos do que na Alemanha, mas, como lembra Foders, boa parte da economia brasileira é informal. "Numa situação assim, alcançar uma carga tributária dessa dimensão já é uma arte."
Indústria brasileira precisa se tornar mais competitiva
Mas o economista também chama as empresas à responsabilidade: "Em vez de tentar manter a concorrência externa fora do mercado através de lobby por tarifas ou proibição de importações, as empresas brasileiras deveriam elevar a competitividade. Se quiserem competir com os chineses, elas precisam ser melhores e mais eficientes."
Entre os grandes
Isso vale especialmente se o Brasil quiser aumentar sua participação no comércio internacional, diz Foders. O Brasil pode até ter superado o Reino Unido e se tornado a quinta maior economia do mundo em 2010. Mas no ranking dos maiores exportadores, ficou apenas com a 22ª posição, atrás da Austrália e da Malásia. As exportações respondem por menos de 11% do PIB brasileiro. Na China, a parcela supera os 25%, e na Alemanha chega a quase 40%.
Esse baixo nível de integração no mercado mundial pode ter salvado o Brasil do pior durante a crise. Mas se o país quiser consolidar sua posição entre os grandes, precisa cuidar para que sua economia vá além do setor de commodities.
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