Rajadas de metralhadoras, ruídos de canhões antiaéreos e explosões de obuses se intensificaram neste sábado em Alepo, metrópole do norte da Síria cercada por tropas do regime de Bashar Assad. Os estampidos anunciaram o início da ofensiva do Exército à cidade, cujo domínio é considerado decisivo para a estabilidade da ditadura imposta pela família Assad, que perdura há 41 anos.
Contra o assédio de helicópteros que disparam do alto e a linha de tanques que se aproxima, os insurgentes resistem enfrentando também o caos organizacional, a falta de treinamento e de armas modernas e pesadas. O que sobra é o desejo de liberdade.
Os confrontos se intensificaram em grande parte da periferia de Alepo no início da manhã, quando o silêncio da noite foi quebrado pelo aumento das explosões nas imediações do bairro de Salahadine, onde está o quartel-general rebelde. No início da manhã, comandantes rebeldes afirmaram que os ataques já faziam parte da grande ofensiva que o Exército regular planejava lançar contra os insurgentes, que dizem dominar 60% da cidade.
Segundo levantamento parcial realizado pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos, ONG oposicionista com sede em Londres - o regime não divulga números oficiais - 17 sírios morreram. Todos tinham perdido suas vidas nos bombardeios aos bairros de al-Fardoos, al-Marjeh e Saif al-Dawleh, no subúrbio ainda sob controle dos ativistas. O corpo de uma criança também já havia sido encontrado no final da noite de sexta-feira, na região de al-Zabadiye, depois de dois dias desaparecida no bairro vizinho de Tariq al-Bab.
Em toda a Síria, 73 morreram até agora, em ataques que se multiplicaram pelo interior do país, em Homs, al-Sajaha, Busr al-Hareer, Otman, al-Hirak, Da'el, Deraa, Hama, Rif Dimashiq, Day az-Zawr e em Damasco, onde dois rebeldes morreram no bairro de Qadam.
Na capital, os combates perdem força, o que desloca o centro do conflito para Alepo. No início da manhã, moradores da cidade com os quais o Estado conversou ainda estavam acordados acompanhando os combates. "Nós não dormimos. Não temos razão para isso. Só conversamos e nos alimentamos antes do sol nascer", disse o jovem rebelde Mohamad Ajz, 21 anos.
Assim, uma das capitais econômicas da Síria deve se tornar nos próximos dias a nova "cidade-mártir" da rebelião, depois dos cercos a locais como Deraa, Homs, Baniyas e Hama, que tiveram a maior parte das mais de 19 mil vítimas da guerra civil. Alepo é uma cidade histórica de 1,7 milhão de habitantes, um dos centros urbanos mais antigos do mundo, que já tinha alta relevância comercial para o Oriente Médio há 4,5 mil anos. O município terá agora de enfrentar a fúria de ambos os lados em guerra.
De um lado estão as Forças armadas regulares, de Assad, dispostas a recuperar o controle da cidade, perdido há seis dias. De outro, cerca de 15 mil insurgentes espalhados pela província de mesmo nome, dos quais entre 1 mil e 1,2 mil protegem um anel rebelde em torno do QG de Sakhour. Para resistir, os insurgentes terão de primeiro superar suas próprias limitações. Ao contrário do conflito na Líbia, os ativistas não estão organizados em brigadas que combatem sob uma mesma chefia, as katibas, mas sob um único grupo guerrilheiro, menos coordenado.
Os comandantes militares do interior da cidade, Hussein Assaf e Abdelcader al-Saleh, reconhecem manter pouca interação com o Exército Sírio Livre (ESL), grupo constituído de oficiais e soldados desertores e rebeldes civis que tem maior organização, mas que se situa fora da área urbana.
Embora aleguem ter conseguido destruir um total de sete tanques desde o início da rebelião, há sete dias, os insurgentes contam apenas com alguns lançadores de granadas RPG, pouco para enfrentar a fila de 83 tanques que, de acordo com os próprios rebeldes, ruma para Alepo. Quem admite é Mawzy Zoaoa, 24 anos, o jovem que destruiu dois blindados que chegaram a 200 metros da base de Sakhour no início da semana. "Da outra vez os outros tanques começaram a recuar. Se Deus quiser, vai acontecer de novo", acredita.
Contando apenas com fuzis AK-47, um tanque apreendido e com algum armamento doado por rebeldes da Líbia, não haverá muito com o que resistir sem intervenção exterior. Sem esmorecer, porém, o comandante Abdelcader al-Saleh ainda crê na vitória. "Temos táticas especiais para atingir esses tanques, e temos diferentes armas", disse ele. "O ESL está tentando nos trazer mais armas. E também contamos com milhares de mártires."
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